News Release

Medir a pulsação das moscas

Study reveals fly hearts respond to danger the same way human hearts do.

Peer-Reviewed Publication

Champalimaud Centre for the Unknown

image: The fly's heart (left) - a minuscule structure made of two single rows of cells - is imaged non-invasively while the fly walks freely on a custom-made device (right). view more 

Credit: Charlotte Rosher, Moita lab, Champalimaud Foundation.

Quem nunca ouviu o som de um coração a bater de forma acelerada e sentiu imediatamente um arrepio na espinha? É mais do que sabido que esse som é sinal de problemas. Estamos tão habituados a que o nosso coração espelhe aquilo que estamos a sentir, que é muito fácil imaginar outros corações a bater depressa, a "doer" ou mesmo a saltar uma batida.

 

E se é natural que os corações de outros vertebrados - sapos, gatos, antílopes - reajam da mesma forma que os dos humanos quando estão em situação de perigo, não é claro que os corações dos insetos tenham essa característica temperamental. E o motivo é estrutural. Os nossos corações são controlados por uma complexa rede de nervos, a que chamamos de sistema nervoso autónomo. Sistema esse que os insetos não têm.

 

Não é por isso de estranhar que, quando investigadores do Centro Champalimaud decidiram investigar a forma como o coração das moscas responde perante uma ameaça, os resultados os tenham apanhado de surpresa.

 

As descobertas da equipa, publicadas hoje (27 de Outubro) na revista Current Biology, revelam que os corações das moscas-da-fruta mudam de ritmo quando estão em perigo, exatamente como os nossos. Este resultado, juntamente com outros também descritos neste estudo, colocam em causa o que sabemos sobre a evolução dos comportamentos defensivos e abre todo um novo caminho de investigação para desvendar as suas bases biológicas.

 

Uma questão de coração

 

A equipa focou-se no coração da mosca - uma estrutura minúscula composta por apenas duas filas de células. Ao iluminar as células do coração com moléculas fluorescentes, os investigadores conseguiram observar a sua atividade, através do exoesqueleto transparente da mosca, enquanto esta andava. Ocasionalmente, um círculo escuro em expansão aparecia projetado numa grande tela, em frente à mosca, simulando uma ameaça que se aproximava.

 

“Surpreendentemente, tal como acontece nos humanos, a atividade do coração da mosca alterava-se em função da resposta de defesa adotada. Se a mosca decidisse fugir, o coração acelerava, mas se a mosca se imobilizava, o seu coração ficava mais lento”, conta Natalia Barrios, autora sénior do estudo.

 

Este era um resultado pelo qual a equipa não esperava. Nos vertebrados, estas mudanças na atividade cardíaca são desencadeadas pelo sistema nervoso autónomo, que simplesmente não existe nas moscas.

 

“Esta descoberta demonstra que a relação entre a atividade cardíaca e a resposta ao perigo é um mecanismo evolutivo vantajoso”, ressalta Moita. “Agora, a questão é saber se o mecanismo que gera essas respostas na mosca é homólogo ao dos vertebrados ou se há um mecanismo totalmente diferente que ainda precisamos descobrir qual é.”

 

Imobilidade perante uma ameça queima calorias

 

Curiosamente, este resultado inesperado foi apenas o primeiro de uma série de outras revelações. Uma das quais aconteceu quando a equipa examinou com mais detalhe a atividade do coração. 

 

“A estrutura do coração da mosca é muito diferente da nossa”, explica Barrios. "Em vez de ter câmaras diferentes, é composto apenas por um único tubo. E como o corpo da mosca é essencialmente dividido em duas secções separadas (o abdómen, nas costas, e o tórax e a cabeça, à frente), o coração bombeia em duas direções, alternadamente."

 

A equipa questionou-se, então, se a direção do bombeamento também mudava em função da resposta defensiva da mosca. Novamente, e para sua grande surpresa, o conjunto de experiências que se seguiram acabou por enfraquecer uma outra teoria científica, até aqui amplamente aceite. 

 

“Descobrimos que em ambos os casos - fugir e imobilizar - o coração bombeava mais ativamente na direção da parte frontal da mosca”, lembra Barrios. "Faz sentido bombear mais nutrientes para a secção frontal, se estiver a fugir. Estando aí localizados o cérebro, as pernas e as asas, é onde se passa toda a ação. Mas não esperávamos ver isso a acontecer quando a mosca se imobiliza."

 

Segundo os investigadores, a imobilização é considerada um comportamento de poupança de energia. A desaceleração do coração indica precisamente isso. Mas então, por que é que o coração estava a bombear mais ativamente para a parte frontal da mosca?

 

“A nossa suspeita era que, embora estivesse imobilizada, a mosca estava a preparar-se para agir”, explica Moita. “E que estava a consumir energia para manter esse estado de preparação”.

 

Para testar esta hipótese, a equipa comparou os níveis de açúcar nos corpos das moscas que imobilizaram com os das moscas expostas a um estímulo neutro, e que por isso não exibiam qualquer tipo de comportamento de defesa. Os resultados foram surpreendentes: os níveis de açúcar das moscas que paralisaram eram significativamente mais baixos. 

 

"Esta descoberta vem refutar a convicção generalizada de que a imobilização é um comportamento passivo de poupança de energia", argumenta Moita. "Contrariamente, sugere que a paralisação é um estado de preparação ativa. Agora, a questão é - para o que é que a mosca se está a preparar? Quais são as ações que podem ocorrer após a imobilização e como é que o cérebro faz a escolha entre as ações possíveis?"

 

Um novo caminho

 

Estas questões juntam-se a uma série de novos caminhos de investigação também revelados por este estudo. Um dos mais prementes consiste em identificar a estrutura neural que, nas moscas, controla as respostas cardíacas ao perigo e decifrar como funciona.

 

“Como as moscas e os humanos partilham muitos genes, o coração das moscas é habitualmente usado para estudar vários aspetos da cardiologia, principalmente relacionados com doenças”, realça Barrios. "No entanto, pouca atenção foi dada para a forma como o coração da mosca reage ao perigo."

 

"Agora que demonstrámos mais esta nova similitude, podemos avançar na investigação de como isto acontece. Eventualmente, esperamos que o conhecimento alcançado na mosca, leve a um entendimento de como o cérebro controla o comportamento em outros animais, incluindo humanos", Moita conclui.

 


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